Enquanto o Brasil avança no reconhecimento dos animais como seres sencientes com direito à proteção jurídica, o relacionamento entre humanos e cães nos condomínios enfrenta desafios significativos. A crescente quantidade de reclamações relacionadas a barulhos de latidos evidencia um conflito entre a sensibilidade dos animais e a convivência harmoniosa entre vizinhos.
O país, que abriga mais de 139 milhões de animais de estimação, conforme dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação, testemunha uma transformação nas percepções sobre esses companheiros de quatro patas. De acordo com a pesquisa anual da Comissão de Animais de Companhia (Comac) do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Saúde Animal (Sindan), denominada Radar Pet, os donos de animais enxergam seus pets como membros da família, uma tendência denominada “famílias multiespécies”.
Entre 2019 e 2021, houve um crescimento significativo no número de pessoas que veem seus animais como filhos e membros da família, enquanto a parcela que os identifica apenas como bichos de estimação diminuiu consideravelmente. Essa “antropormofização” dos animais de estimação reflete a transformação gradual de suas posições na sociedade, culminando em contratos e litígios sobre a guarda dos animais em casos de divórcio, além da emissão de certidões de nascimento para os mesmos.
Contudo, esse reconhecimento legal e social dos animais como seres sensíveis e parte integrante das famílias traz consigo desafios na convivência comunitária, especialmente em ambientes condominiais. O aumento das reclamações relacionadas a barulhos de latidos de cães revela um choque entre a nova percepção dos animais e a realidade dos espaços compartilhados.
A proposta de incluir no Código Civil o artigo 91 A, reconhece os animais como seres vivos sencientes, passíveis de proteção jurídica própria, destacando a necessidade de tratamento físico e ético adequado.
No entanto, a falta de regulamentação específica sobre o convívio entre humanos e animais em ambientes coletivos deixa lacunas a serem preenchidas, levando muitas vezes à aplicação de disposições relativas aos bens, nem sempre compatíveis com a sensibilidade animal.
Nesse contexto, a busca por soluções que conciliem o respeito aos direitos dos animais com a convivência harmoniosa entre vizinhos torna-se indispensável. Medidas como a conscientização dos tutores sobre a importância do treinamento e da socialização dos cães, a implementação de espaços adequados para atividades físicas e recreativas, e o estabelecimento de regras claras dentro dos condomínios podem contribuir significativamente para mitigar conflitos.
A relação entre humanos e cães nos condomínios reflete, portanto, um cenário complexo, no qual avanços legais e mudanças sociais se confrontam com desafios práticos de convivência. É fundamental que a sociedade e as autoridades estejam atentas a essa dinâmica em constante evolução, buscando encontrar um equilíbrio que promova o bem-estar de todos os envolvidos, humanos e animais, no ambiente condominial.
Cleuzany Lott é advogada especialista em direito condominial, síndica, jornalista, publicitária, Diretora Nacional de Comunicação da Associação Nacional da Advocacia Condominial (ANACON ), produtora e apresentadora do podcast Condominicando.
Sou síndico profissional.
Construir uma harmonia no residencial onde há um número expressivo de pets,tem sido uma tarefa complexa e constante.