As redes sociais e os dispositivos móveis transformaram a forma de comunicação. Hoje poucos lembram, mas era difícil estabelecer contato antes da popularização dessas tecnologias. Fax, cartas, ligações telefônicas. Esses eram alguns dos meios disponíveis para comunicação que parecem ter ficado em um passado bem distante.
A comunicação digital veio para encurtar distâncias e possibilitar uma interação mais rápida e eficiente. Nesse contexto, algumas ferramentas foram surgindo para facilitar ainda mais a forma de se comunicar. Uma delas, sem dúvida, é o WhatsApp, ideal para enviar mensagens em tempo real e receber respostas imediatas. Hoje, quase todo mundo tem o aplicativo no celular, não é mesmo?
Com milhões de usuários espalhados pelo mundo, o WhatsApp vem se consolidando como uma ferramenta fundamental, principalmente pelas funcionalidades que oferece, como a criação de grupos. Tem o grupo da família, o grupo dos amigos, o grupo de trabalho e, por que não o grupo do condomínio?
Pela praticidade, o síndico, muitas vezes, opta por criar um grupo para trocar informações importantes do condomínio com os moradores. Mas será que essa realmente é uma boa escolha? É importante ficar atento para o uso de grupos de WhatsApp em condomínios, pois, o que aparentemente se mostra como uma boa ideia, pode se tornar uma dor de cabeça para o condomínio.
Antes de mais nada, é importante reforçar que é interessante que a criação de um grupo de WhatsApp seja aprovada em assembleia, afinal, com o grupo, necessariamente, ficarão expostos dados pessoais do morador, como nome, número de telefone celular e fotos. Só por qualquer um participante ter acesso a essas informações, já é considerado violação da intimidade. Dessa forma, os moradores precisam autorizar sua participação no grupo.
Porém, não é isso que acontece na prática. Na maioria das vezes, a criação do grupo acontece de maneira totalmente informal e não há um critério definido para adicionar as pessoas ao grupo.
Mas o grupo de WhatsApp de condomínio é um meio de comunicação formal? Qual o objetivo? Como mediar conflitos? Quem pode fazer? É necessária a realização de uma Assembleia?
Se você é síndico de um prédio e está pensando em criar um grupo Whatsapp para o seu condomínio, não crie antes de ler este artigo até o final!
1 – Quem pode criar o grupo de WhatsApp do condomínio?
Essa é a primeira pergunta que deve ser respondida antes da criação de qualquer canal de comunicação de um empreendimento: O grupo sempre deve ser criado pelo(a) administrador(a) ou síndico(a) do prédio e aprovado em assembleia.
Se um morador já tiver criado o grupo, o síndico deve conversar com ele, explicando as consequências de manter um canal de comunicação “paralelo”: ausência de distribuição de responsabilidade, importunação e deficiência de resultados. No caso de já existir um grupo de WhatsApp e acontecer nova eleição de síndico, o dono do grupo de WhatsApp deve nominar outro participante como administrador do grupo, não havendo a necessidade da criação de novo grupo para cada gestão sindical.
2 – Como criar o grupo de WhatsApp de condomínio?
Agora que você já sabe quem pode criar o grupo, a pergunta é como criá-lo. A criação do grupo deve ser submetida à autorização dos condôminos em uma Assembleia convocada especificamente para este fim .
Importante ressaltar também que, mesmo após autorizada a criação, a participação no grupo por parte do condômino é opcional, devendo os integrantes autorizarem a divulgação de informações pessoais em um grupo coletivo , isso pode ser condicionado a própria assembleia de criação do grupo.
Em outras palavras, o número de telefone é um dado pessoal e sigiloso, sendo do condômino e do morador a escolha de expor seus dados para os demais moradores em um grupo , desde que concordem expressamente com os termos e de autorização a administração.
3 – O grupo de WhatsApp de condomínio é um canal de comunicação oficial?
Apesar do caráter de autorização em Assembleia, o grupo do WhatsApp, mesmo que sob gestão da administração do condomínio, é considerado um canal de comunicação complementar, mas não oficial.
Isso quer dizer que reclamações, por exemplo, devem ser feitas no Livro de Ocorrências.
O grupo de WhatsApp pode sim ajudar em muitos aspectos: emergências, decisões rápidas, avisos urgentes ou até questões referentes ao entorno do prédio; mas as demandas lá colocadas só serão resolvidas pelo síndico após a formalização das solicitações.
Por isso, o WhatsApp é considerado um canal de comunicação complementar, não esquecendo outros canais de comunicação do condomínio, como e-mails e murais, conforme descrito, eventualmente, na Convenção do prédio.
Vale ressaltar que decisão proferida pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou a inviabilidade de prints de WhatsApp como meio de prova. Ou seja o livro de ocorrências ainda o documento oficial de comunicação entre moradores e síndicos, sendo aceito como prova em processos judiciais .
4 – Como gerenciar um grupo de WhatsApp de condomínio?
Algumas situações do nosso cotidiano nos levam a pensar em grupos de WhatsApp como sinônimo de “baderna”, pessoas falando o que não deveriam, desorganização e bate-boca. Mas é possível ter uma gestão de grupo organizada, vou lhe passar dicas preciosas para isso:
* Administração do grupo: como explicado acima, é essencial que o grupo seja administrado pelo(a) síndico(a) ou administrador(a) do condomínio, assim como acontece com os demais meios de comunicação do empreendimento (murais, e-mail etc)
* Estabeleça regras claras de conduta e de uso do grupo: liste quais devem ser os assuntos prioritariamente abordados (reformas e uso de espaços comuns, por exemplo) e quais tópicos devem ser evitados (política, religião e ofensas).
É possível, inclusive, esclarecer os “horários de funcionamento” do grupo, comunicando os prazos de resposta das comunicações enviadas. Estas informações devem ser enviadas por mensagem e colocadas na descrição do grupo.
Explique o objetivo do grupo e fale como é importante contar com a colaboração de todos para o bom uso do grupo, e procure chamar a atenção de algum morador mais “rebelde” de forma particular.
* Estabeleça quem pode enviar mensagens no grupo: hoje, o WhatsApp oferece diversas opções de configuração de grupos, inclusive a escolha de é habilitado a enviar as mensagens. Ao configurar que somente os administradores têm o poder de fala, retira-se o caráter de interação do grupo; mas esta limitação pode ser uma opção para condomínios muito grandes ou nos quais os moradores têm dificuldade de seguir diretrizes. Neste caso não há que se falar em cerceamento de direito, uma vez que os direitos são limitações de acordo com a proporcionalidade e neste caso prepondera direito coletivo e harmonia do grupo .
* As regras valem para todos, inclusive para os síndicos: nunca devem ser expostas cobranças ou dados pessoais dos integrantes do grupo. Os participantes também devem ser tratados com respeito e acolhimento.
Recentemente a 4ª turma Cível do TJ/DF manteve, por unanimidade, decisão que condenou uma condômina ao pagamento de indenização por danos morais, em virtude de ofensas proferidas ao síndico do condomínio por meio do aplicativo WhatsApp.
Após a realização de assembleia geral de condomínio, alguns integrantes de um grupo no aplicativo, restrito aos condôminos, proferiram diversos comentários depreciativos da sua atuação administrativa, tais como “só tem roubo” e “na certa tem caixa 2”. Em 1º grau, o juiz condenou uma das mulheres ao pagamento de indenização de R$ 2,5 mil.
Ao julgar o recurso, o desembargador Sérgio Xavier de Souza Rocha afirmou que a imputação da prática de “caixa dois” não se confunde com meras críticas, pois atinge a honra, a reputação e a dignidade síndico. O relator apontou, ainda, o elevado grau de lesividade do ato ilícito, pois as ofensas foram perpetradas em grupo de WhatsApp com, aproximadamente, 213 participantes, todos de convivência diária com a vítima.
Ferramenta facilita comunicação, mas precisa ser usada com bom senso, principalmente ao criticar ao reclamação de alguém, seja de síndico para morador ou vice-versa
Ocorre que, ao contrário do que muitos pensam, a rede social não é terra sem lei, onde tudo pode ser feito sem que gere consequência. Com isso, ao se dirigirem nesse ambiente virtual, é importante que os condôminos tenham cuidado com as repercussões de uma manifestação mal compreendida ou interpretada, sob pena de prestar explicações em âmbito de ação judicial, seja na seara cível ou na criminal.
É certo que todos que moram em condomínio têm o direito de reclamar ou discordar de alguma prática que vem sendo realizada, mas esse direito tem que ser exercido dentro de um limite de razoabilidade, evitando excessos a ponto de atingir o sentimento pessoal de dignidade, que, fugindo à normalidade, cause sofrimento, vexame, humilhação, alteração do equilíbrio psicológico do indivíduo e até mesmo duradoura perturbação emocional.
São comuns os casos em que moradores insatisfeitos com a administração do condomínio fazem uso de grupos de Whatsapp para disparar desconfianças quanto à idoneidade do síndico ou ofendem as pessoas que estão à frente da administração, quando são tomadas medidas que vão de encontro com os interesses de determinados moradores.
Alerta-se sempre que expor moradores, síndico, administradora e membros do conselho consultivo fiscal à situação vexatória dentro desses grupos (e vice-versa) pode gerar o dever de indenizar por danos morais os ofendidos, além da obrigação de fazer, que seria a retratação perante o condomínio, além da repercussão na esfera criminal, situações essas comumente discutida em nossos Tribunais
Existem pessoas que acreditam erroneamente que, por se tratar de grupo de condomínio, as críticas e trocas de mensagens ali proferidas são legítimas, sendo assim não sendo passível de ajuizamento de ação. Ocorre que tal fato fere o direito ao contraditório e ampla defesa e, mesmo sendo grupo fechado, os mesmos ficam sujeitos ações judiciais tanto na esfera civil como criminal.
Por esse motivo, os grupos de WhatsApp criados pelos condomínios devem ser utilizados com atenção, cuidado, sem excessos e, principalmente, norteado pelo bom senso, educação e razoabilidade, para que não se perca ou inutilize essa excelente ferramenta de aproximação dos moradores.
Criou o grupo de WhatsApp e não deu certo?
Cada condomínio tem a sua particularidade. Em alguns casos, os proprietários não moram perto do imóvel e o grupo facilita a resolução de decisões; em outros, o prédio tem muitos moradores que não seguem as diretrizes estabelecidas, e o grupo torna-se desorganizado.
Caso a ferramenta não se adapte à realidade do empreendimento, é hora de pensar em excluir esse canal de comunicação.
Para isso, é ideal que seja realizada o mesmo protocolo da criação do grupo: uma Assembleia que autorize a extinção do grupo.
Enquanto síndico(a), exponha as dificuldades que o grupo está enfrentando: falta de concordâncias e ofensas, ou até mesmo falta de tempo pessoal para se dedicar ao canal.
Enfatize os demais canais de comunicação existentes, como o e-mail, telefone, cartas ou site. Se feito de forma respeitosa, temos certeza que seus condôminos irão concordar!
Dr. Leandro Souza, Advogado e Administrador, Doutor em Administração com PhD em Ciências Jurídicas . Diretor Executivo na Adminsitradora Sindix . Membro da Comissão de Direito Condominial na OAB-RJ. Autor do livro “Fui Eleito Síndico e Agora?” e “Como Montar uma Administradora de Condomínios”.