A presença de animais em condomínios, especialmente os animais comunitários, que são aqueles que estabelecem laços de dependência e manutenção com a comunidade em que vivem e que não possuem um tutor específico, gera frequentemente debates acalorados e conflitos entre os moradores.
Os direitos dos animais comunitários vêm sendo reconhecidos pela Justiça, como pode ser observado em recente decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que reconheceu o direito de gatos que viviam em um condomínio da zona oeste do Rio, de permanecerem na área externa de onde viviam, ficando sob a responsabilidade de protetores que moram no local. Foram reconhecidos como “comunitários”.
No Estado do Rio de Janeiro, a Lei nº 4.808/2006, alterada pela Lei nº 6.464/2013, considera como animal comunitário aquele que, apesar de não ter proprietário definido e único, estabeleceu com membros da população de onde vive, vínculos de afeto, dependência e manutenção. Esses animais são seres sencientes, que possuem direitos fundamentais, como direito à vida, saúde e bem-estar animal, os quais devem ser garantidos pela coletividade.
Em Petrópolis, por exemplo, a Lei Municipal nº 8.434/2022 prevê expressamente o direito dos animais comunitários permanecerem onde eles se encontram, além do direito dos moradores de condomínios residenciais pro[1]verem cuidados necessários aos animais que ali se estabelecerem, às suas expensas.
É possível evitar o litígio relacionado a presença de animais nas áreas comuns. Questões como odores, sujidade, preocupações com higiene e saúde e desacordos sobre regras e responsabilidades acabam levando a intermináveis brigas através do judiciário. Daí nasce a importância da busca de acordos extrajudiciais, que promovam o consenso e o diálogo, onde as pessoas em conflitos compartilhem suas ideias e juntas cheguem a um entendimento, preservando o direito e o bem-estar dos animais, de seus protetores e de todos os que ali convivem.
A mediação animalista em condomínios surge como uma ferramenta crucial para encontrar soluções pacíficas e duradouras para conflitos relacionados à presença de animais. No Rio de Janeiro, com sua grande população urbana e concentração de condomínios, essa prática ganha ainda mais relevância.
No ano de 2023 foi realizada no Rio, a primeira mediação animalista do Brasil, envolvendo um conflito acerca da permanência dos animais comunitários que viviam na área comum de um condomínio em São Gonçalo. Por meio de um acordo com validade de título executivo extrajudicial, firmado em procedimento de Mediação Extrajudicial Animalista e facilitado pelas mediadoras animalistas, foram assegurados os direitos da moradora protetora dos gatos comunitários e dos demais condôminos a conviverem num espaço comum, em harmonia e com respeito a todos.
Ao ser notificado extrajudicialmente pela advogada da moradora, o síndico do condomínio buscou a assessoria jurídica especializada em direito animal e mediação de conflitos extrajudicial. A mediação animalista foi aceita por ambas as partes e realizada com êxito. Foram acordadas cláusulas e condições para ambos, condomínio e protetora, tendo ocorrido a regulamentação da permanência dos animais no condomínio, com a destinação de local para alimentação, indicação de providências a serem tomadas em caso de maus tratos, respeito a ordem do condomínio e dos condôminos, entre outras regras e compromissos a serem assumidos pelos medianos.
A mediação animalista se apresenta como uma ferramenta poderosa para superar os desafios relacionados à presença de animais em condomínios. Através do diálogo construtivo e da busca por soluções conjuntas, é possível construir um ambiente mais harmônico e inclusivo para todos os residentes, incluindo os animais de estimação.
Autora: CAMILA PRADO DOS SANTOS, Advogada. Professora de Direito Animal. Membra da Comissão de Proteção e Defesa dos Animais da OAB/RJ e Presidente da Comissão de Direito Animal da AABA